Matrix
e a Receita da Felicidade
Odair José (cantor e compositor brasileiro) gravou, em tempos passados, uma canção que tinha este refrão docemente existencialista: “Felicidade / não existe; / o que existe na vida / são momentos felizes”.
Mas então, o que é a felicidade? Uma alegria sem sobressaltos, sem alterações, sem mudanças? Uma euforia momentânea cujo disco engancha e ficamos a senti-la forever? Um estado sorridente de-bem-com-a-vida, cheio de adjetivos, como a dos personagens de propagandas de refrigerantes e de creme dental?
Mistério.
Vamos enxergar então essa cena: digamos que é construída uma máquina onde você pode se plugar e ter (virtualmente) qualquer sensação ou situação que desejar. Estímulos neuropsicológicos podem lhe dar uma impressão 100% real de estar escrevendo um livro, conversando com amigos, fazendo coisas interessantes que o tirem da normalidade. Só que você estaria de fato, o tempo inteiro, flutuando num tanque, com eletrodos afixados ao seu cérebro.
Agora a pergunta é: Você acha que isso é a felicidade? Você gostaria de viver assim?
Suponhamos então que metade das pessoas diria: "Sim, por que não? Melhor viver assim, numa Felicidade Virtual, do que viver pegando trânsito, pagando contas, ralando no dia-a-dia". Ok; entendo perfeitamente que prefiram essa tranquilidade, essa utopia cibernética, esse paraíso artificial.
Mas outra metade diria: "Não, prefiro viver como vivo, e me arriscar a não ser feliz nunca, ou ser apenas de vez em quando, como Odair José".
Na minha percepção, o que chamamos de 'felicidade' não é um aspecto individual, é coletiva, ou pelo menos é socialmente interligada. Ser ou sentir-se feliz não é apenas sentir-se bem consigo mesmo, é sentir-se bem de uma maneira que dependa das consciências alheias. Não basta ser feliz, é preciso que nossa felicidade seja testemunhada e de certa forma compartilhada pelos outros.
Acredito eu que felicidade artificial em excesso, resulta em situações como quando nos recusamos a nos 'plugar nessa máquina', que nos proporciona tais experiências artificiais, exprimimos nossa crença profunda de que o que obtemos de uma máquina não é a coisa mais valiosa que podemos obter; não é o que queremos de um modo mais profundo, não importa o que possamos pensar quando estamos plugados nela. A vida nessa máquina não é a obtenção do que buscamos quando falamos numa vida feliz.
Bom, sou bem suspeita para expressar minha opinião quanto a isso, já que aceito muito mais o concreto e material. Tenho nada contra as duas opções de vida, seja virtual ou não até porque cada um escolhe seu caminho, mas acredito que nada substitui uma boa convivência dia-a-dia.
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